segunda-feira, 22 de junho de 2015

Sim

  Estava tão escuro quanto os cabelos que caíam cascateando pelos ombros desnudos. Só a luz da lua fugidia delineava traços de luz em seus detalhes. Suspirou tão profundamente, soltou os ombros antes duros feito pedras e sentiu um toque quente de dedos macios e firmes, fortes e delicados. O cabelo estava jogado apenas em um dos ombros, um roçar de lábios robustos arrepiava seus finos pelos da nuca e espasmos de saudade presenteavam. O sentimento de um mundo inteiro nas costas era coisa difícil de ser carregada, doía na alma, naquela alma velha e remendada que ela mantinha em silêncio nas horas comuns da trivialidade dos olhares curiosos. E então, aquelas mãos de homem, não mãos quaisquer, as mãos que acalentavam seus espasmos-surtos-questionamentos-desesperos-choros-lágrimas-silêncios-fugas. Eram olhares de tempos tão antigos que nem sabiam mais de quando eram. Sentiam. A presença da singularidade consistia em reconhecer-se nas nuances do outro - sendo o outro tão outro que já é entrega súbita - uma outra morte. Corpos caminhavam ao seu redor e ela só via traços vultos vozes passos pressa.  Pressa de quê? Desacelera a chegada do fim, o processo é a melodia do acaso premeditado. No quarto escuro - estariam ali ou cá? - não só as mãos, mas o encostar das palavras silenciosas cortava o vento vindo da janela aberta. A mesma luz da lua lambia seus corpos desarmados e confusos, numa espera que tinha sido já tão longa e imaginativa. Adormeciam acordavam conferiam estavam lá estavam onde acontecia? O real sempre se mistura aos desejos embutidos e silenciados pelo que esperamos de nós mesmos. O freio apenas adia o que nunca  deveria ter sido. Acordo.

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