domingo, 11 de janeiro de 2015

Ancestral

 As batidas dos tambores ribombam com uma cadência certeira para mover a alma. Eu sacudo da direita para a esquerda e de cima para baixo, com alguns tremeliques nas minhas pulseiras repletas de pequeninos pingentes dourados de andorinhas. Agora já posso finalmente ouvir um grave som de acordeão, um daqueles grandes e antigos tocados por mãos calejadas e firmes. Uma coroa de flores dança no topo da minha cabeça e algumas pequenas rebeldes caem no comprimento dos meus cabelos soltos. Enquanto eu rodopio, elas deslizam e acariciam o chão salpicado de papéis coloridos e cinzas dos defumadores de alecrim e alfazema. A fogueira, acesa e flamejante, enrubesce minha tez bronzeada pelo sol do dia inteiro e me faz sentir as gotículas de suor desenhando símbolos indescritíveis nas minhas costas. Enquanto rodopio mais um pouco, elas - as flores, as gotas, as cinzas, as imagens - circulam pelo ambiente e se tornam um só ritual de entendimento. Termino de frente para um choupo antigo, ancestral, uma vó serena e robusta, e me demoro num abraço. Ali, minha energia é repassada e reparada. Minha essência retorna não ao corpo, mas ao espírito jovem e à alma senil, porém guerreira. Somos todas nós árvores fincadas na terra que resistem às intempéries e voltam os olhos para o céu buscando um anúncio de que a paz está por vir um dia...

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