segunda-feira, 16 de março de 2015

Voo raso

 Era de longe que ela vinha com asas nos pés e um espiral de incertezas nas mãos pequeninas e sujas com pó de passado. Uma saia longa cobria sua pele alaranjada pelo sol e uma blusa branca caía lindamente por seus ombros salpicados de pintinhas marrons - ela dizia que eram uma constelação de dias de férias. Eu gostava de olhá-la porque ela era de uma fluidez inconstante e tranquila, como seu pudesse sentir, mas não desse tempo de tocar antes que se esvaísse no universo. Via nela pedras e cristais flutuando no éter da curiosidade, ela ria e sorria para o vazio. Acreditava não em deusas e deuses, mas em pássaros e borboletas na barriga. Acreditava sim nos dias ensolarados debaixo de árvores frutíferas e de noites perto da fogueira na areia da praia silenciosa de sentimentos humanos. Eu via nela a mim mesma e todas aquelas dúvidas que surgem na solidão e na pausa, eu poderia ter sido um pouco dela, porém não poderia também. Somos humanos em nossas diferentes formas de ser e sentir que vamos sendo ou deixando de ser. Somos peculiaridades com combinações infinitas e esquisitices escondidas que não sobrevivem à intimidade. Somos singularmente plurais.

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