Hoje eu acordei com sua voz ecoando na minha mente uma
música qualquer. Eu não quis fugir daquilo, porque eu queria mais de você em
mim, eu queria mais um pouco da sua sintonia flutuando no ar, um pouco mais do
seu sorriso no meu infinito de complicações. Você permite que eu explore um
lado meu que muitas vezes é incompreendido, um lado que é quase instinto, se
não houvesse tentativa. Ao seu lado, no escuro da consciência, um beijo traduz
a ilusão de não querer me iludir, transcreve os mais estúpidos paradoxos no
corpo, e vibra a cada promessa quebrada. Não sei o que é isso – se é uma
conexão que transcende o meu nível de entendimento das coisas, se é algo movido
pelo instinto ou se é uma idealização natural. Cheguei à conclusão de que esse
desejo desenfreado é indefinível, deixando aquela vontade de tentar mais uma
vez, de superar as expectativas, de deixar acontecer da maneira mais tribal e
não planejada.
terça-feira, 29 de janeiro de 2013
segunda-feira, 28 de janeiro de 2013
Fumaça de café
Ele ouviu seu nome ecoando pelo ambiente logo após algumas tentativas. Olhou para trás e um sorriso inundou seu rosto silencioso. Voltou alguns passos e um abraço em forma de borboleta veio e pousou em seu corpo quente feito fumaça de café recém passado. O tempo passou feito bruma branca, feito uma cortina de renda francesa que permitia entrever as palavras escritas nos olhares de entendimento mútuo. Gargalhadas ecoando feito festa de criança, feito jardim de manhã, feito reencontro infinito. As mãos que se tocavam por um motivo meramente explicativo, mas que sabiam ter o toque um valor ultradimensional. Cada esbarrão era motivo para sentir, por debaixo das roupas espessas e ásperas, o calor da pele fina, traduzindo cada linha em sussurro inteligível e cada roçar de sonhos esquecidos em abraços casuais e propositalmente planejados. Ele era o acordar se desmantelando em palavras sem sentido, em pronúncias vagas e emboladas, em carinho para se distribuir feito flor. Ela era cheiro de turbulência, de chocolate quente, de beijo na orelha antes de dormir, de mãos perpassando o corpo que não pede só amor, mas um pouco de orvalho durante a tarde rotineira. Ela é, e também deixa de ser, sem ritmo, sem compasso, sem pretensão, uma poesia concreta com os artifícios mais abstratos que jamais leu - ela vem e não pede passagem para a saudade.
sábado, 26 de janeiro de 2013
Sublime
“Não sou daqui.”, disse ela, abaixando os olhos, o tom de
voz diminuindo no finalzinho da frase, o sorriso hesitante e as mãos segurando
o portão para que em seguida eu passasse. Eu senti uma verdade tão grande em
uma frase tão simples, logo completada com “Você sabe pra que lado pego o
metrô?”. Eu, mais perdida do que cego em tiroteio (que os cegos me perdoem por
serem sempre colocados em situações de risco nas frases), disse que não, e
segui meu caminho novo. Novo sim, porque nem eu sabia voltar pra casa direito,
e como eu poderia ajudá-la? Não me despedi, nem a conhecia, e talvez nunca mais
a veja. Só que ainda me lembro de seus cabelos castanhos em um coque, lembrando
um doce confeitado de padaria, seus olhos hesitantes, seu rosto sem maquiagem,
sua roupa casual e seus chinelos brancos de dedo. Algo naquele olhar esverdeado
me lembrava de alguém que finjo não ser durante o dia. Alguém que pergunta pra
onde ir em cima da hora, sem planejar antes, sem preocupações – ela não parecia
nada além de cansada. O que havia feito no dia anterior? Teria ela trabalhado
até mais tarde na sexta-feira? Ou ela teria cuidado da sua avó doente e
esquecida? Teria ela tirado as roupas do armário e retornado a guarda-las? Ou
teria apenas adormecido em cima de seus livros da faculdade? Vai saber, mas
ainda vou descobrir, ao encostar a cabeça no travesseiro, onde ela vai em seus
sonhos antes de acordar tão sublime.
quarta-feira, 23 de janeiro de 2013
Minha saudade é tempo que se contorce e muda de ritmo. Não é saudade do que já passou, mas saudade de um eu que imaginei ser um dia. As expectativas são um passo para a frustração, e aqui estou eu, mais uma vez me contradizendo com afirmações despropositais. Minha poesia é multifacetada, possível de ser interpretada à sua própria maneira se quiser. Eu posso fingir um sorriso para arrancar um outro seu, posso dizer o que você quer ouvir, mas posso também virar as costas sem motivo aparente e desviar meu caminho do seu. Sou inconstante, meu bem, mas nada que um beijo guardado no seu pescoço não cure. Não me leve a mal, mas minha cabeça anda à mil, meu corpo se disfarça em palavras, minha boca não se cala até conseguir o que quero. Me peça tudo, menos para manter uma opinião até o final - estou sempre disposta a virar o jogo.
sexta-feira, 18 de janeiro de 2013
Aqueles que nunca dormem
A cidade já dormia, embalada em uma aura de simplicidade e
quentura, aconchegando com suas luzes artificiais, luzes quentes, luzes próximas,
luzes coloridas feito balão que sobe ao final da tarde de verão. Os sorrisos
agora tomavam forma de sonhos escondidos e se fechavam em uma sincronia
milimetricamente imperfeita, uns permitindo a passagem de ar pelos lábios,
outros relaxando a musculatura, mantendo-os levemente inchados e róseos. A
beleza que se via à noite era incontestável, porém invisível aos olhos dos
viajantes noturnos, dos bêbados enluarados, dos caixeiros-viajantes que naquela
hora jantavam com suas famílias sonolentas. A realeza consistia em um jogo de
mistério entre o que aconteceu na noite anterior e o que aconteceria depois da
meia noite do mesmo dia que se seguia. Era o devaneio, permitindo que os
metidos a poetas sentassem à luz das lamparinas das praças, roçando seus dedos
empoeirados nas folhas ásperas e amareladas, fantasiando um sono que nunca
viria de olhos fechados. Eles, os sonhos personificados, precisavam dos olhos
bem abertos para permitir que a magia acontecesse durante o dia dentro de cada
um que tocasse em cada página escrita por aqueles que nunca dormem.
quinta-feira, 10 de janeiro de 2013
Sou o tempo
O tempo que corre e me inunda com suas múltiplas possibilidades. A renovação do ser, a múltipla dúvida do não ser ou do querer, a passagem que não cessa, a idade que avança, a pele que desmancha, o medo da desfiguração. A vaidade que perpassa os limites, a aceitação de corrói os dias, o não entendimento da própria alma, o saber que cada dia extravasa. Eu, num solilóquio ininterrupto com o tempo - aquele que é o personagem mais intrínseco do meu âmago.
quarta-feira, 9 de janeiro de 2013
Filtros reais
É tão mais fácil separar os lábios e mostrar um sorriso triunfante do que admitir que errou. É tão mais cômodo mentir, e na própria mentira acreditar, do que fabular apenas em cima da verdade, que já deixou de ser verdade há tempos. Me atenho aos meus próprios filtros da realidade, nesse cotidiano febril e insano, nessas ruas alagadas pela hipocrisia, nessas nuvens de querência insaciável, nessa poesias sem plurisignificação. Quero voltar no tempo que nunca existiu, naquele tempo em que a verdade era tão floreada que mentir não parecia tão ruim, naquele tempo que andar no meio fio era menos perigoso, naquele tempo que um choro se calava antes de se precipitar. É melhor estacionar, então.
sexta-feira, 4 de janeiro de 2013
Metamorfose do esquecimento
O chão estava coberto
por uma sujeira espessa e escura, formando uma espécie de tapete de restos do
dia anterior. A janela guardava marcas de palmas de mãos, carimbadas pelo frio
que fazia lá fora. O piso, de tão gelado, havia congelado as marcas
amarronzadas de sangue que se espalhavam feito epidemia pelos ambientes da
casa. Eu tentava fugir das lembranças, mas era tudo tão vivo na minha mente, e
não ia embora, não fugia, não escapava, não me deixava. Meu coração acelerava a
cada respiração mais forte que eu dava, sentindo profundamente o cheiro da dor
que me dilacerava a cada toque nas paredes antes tão aconchegantes, e me tirava
o sorriso do rosto com um tapa bem acertado. As memórias eram tão frescas, e a
cada segundo eu fazia mais força para fixa-las em minha mente, como um castigo
bem merecido. Eu não sabia mais quem era aquela pessoa que havia se perdido
dentro me mim, aquela mulher que abria as janelas para a luz do dia entrar,
aquela pessoa que escrevia cartas para cada dia que me encontrava fora para
minhas viagens à trabalho, aquele ser humano que se preocupava com o bem estar
daqueles que me rodeavam. De alguma forma, o que eu fui já não importa mais,
porque o que restou foi tão pouco, e é tão inútil tentar resgatar o pretérito
quando o presente é pura imperfeição. Eu vesti minhas mágoas e pus o pé para
fora de casa para refrescar o corpo, porque os pensamentos continuariam
pulsantes, fervendo a cada ultrapassagem de sangue pelas minhas veias. Você
disse que iria embora, e foi, junto com minha paciência. Por quê? Por que tanta
vontade de fazer sofrer, tanto desejo de arruinar a vida alheia? Por que
perfurar ainda mais a ferida que estava aberta, jorrando de agonia, por que rir
quando não se acha graça, quando não...Espera, espera eu fechar a porta da rua,
porque eu vi um dos seus sorrisos caminhando por aqui. E como se não bastasse,
você ainda mantém alguém espionando cada passo que dou? Que você não tenha
escrúpulos, eu compreendo, mas você deveria ter vergonha de tentar me dominar a
cada respiração. Como se eu fosse desistir de tudo por medo...a dor é tão
grande que anestesia qualquer resquício de hesitação. Eu pus tudo a perder, mas
que então você exploda junto ao seu egoísmo e egocentrismo solitários. Eu vou
sair, então não espere ver meu rosto mais nenhuma vez. Porque dessa vez eu fui
para não voltar. Hoje vesti minha capa de felicidade, e vou tentar mais uma
vez. Sem mais.
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